quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

A RELAÇÃO DO CIÚME PATOLÓGICO COM A INFÂNCIA

Por Néa Tauil

É fato que todos nós cultivamos certo grau de ciúmes. Mas, esse sentimento,  em sua forma excessiva tornou-se um dos principais responsáveis pelo aumento da violência doméstica ( que envolve tanto a agressão física quanto à verbal) e, consequentemente, dos homicídios, que são noticiados diariamente.

As causas do ciúmes estão estritamente relacionadas à infância, como afirma Skoloff, (1954, apud, Alves, 2001, p.18) “o ciúme excessivo das pessoas adultas, de caráter neurótico, irracional, tem sua real origem nos traumas ciumentos da primeira infância”. Dessa forma, podemos afirmar que o ciúmes patológico está associado às vivências da infância.

Como se sabe, todos nós já fomos um recém-nascido, um bebê, uma criança, por isso, temos uma história única e específica de nossa infância e, a maioria das histórias infantis estão cheias de dores e dificuldades individuais  vividas  na infância e que registram, em cada um de nós, um padrão de funcionamento. Com isso, pode-se dizer que as gravações psíquicas e emocionais da nossa primeira relação com mãe ou pai estão registradas para sempre em nosso inconsciente. Ou seja, temos inscrito em nós um padrão - características "formatadas" nessas relações fundamentais com nossos pais   - de desejo, ciúme, ódio, aversão, amor, traição, mágoa, ressentimento, desconfiança, etc.  A forma de cada criança vivenciar essa relação influenciará toda sua estrutura psíquica, determinando, na vida adulta, como essa pessoa irá se posicionar frente ao amor e viver a fantasia de ser amada ou rejeitada.

Isso mostra que não é por acaso que o ciúme patológico - no contexto de um relacionamento amoroso -  compreende vários sentimentos perturbadores, desproporcionais e absurdos, os quais determinam comportamentos inaceitáveis ou bizarros. Esses sentimentos envolvem um medo desproporcional de perder o parceiro(a) para um(a) rival, desconfiança excessiva e infundada, gerando significativo prejuízo no relacionamento interpessoal. Considera-se que o ciúme patológico pode se mostrar em três casos: na forma de ciúme prevalente (que surge como um traço isolado), de ciúme obsessivo (quando a pessoa tem idéia fixa na traição e não consegue parar de pensar nisso) e de ciúme delirante (a convicção fantasiosa de que a outra pessoa é infiel, ainda que o fato não tenha qualquer nexo com a realidade). 

Segundo Bernardo Stamateas (2010), o ciumento tem medo de perder porque não tem a permissão interior de ter. É alguém que cresceu em um ambiente de violência e abandono, onde o pai ou a mãe sempre o desqualificavam, ou  o enganavam, enfim, em um lugar onde os pais não davam permissão, ou seja, lugar onde faltou validação. Diz ainda que  os pais são aqueles que devem bendizer os filhos, já que isso significará dar permissão para ter, viver e poder. Talvez isso explique porque uma das características mais comuns da pessoa excessivamente ciumenta é a baixa autoestima. Ela não acredita que tem valor e merece respeito. Acha que é alguém que a qualquer momento pode ser traído e abandonado. Somam-se ainda fatores como insegurança, medo, instabilidade e a própria desorganização pessoal.


É fato que crimes passionais, privações momentâneas de consciência, adesões afetivas inexplicáveis e violentas falam de várias reações a um buraco afetivo acontecido no começo da infância e que precisa ser preenchido de qualquer maneira, para que algum sentido aconteça ao afeto perdido inexoravelmente. Assim, podemos perceber, logo de início, que o ciúme não se trata de um sentimento voltado para o outro, mas sim voltado para si mesmo, ou seja, para quem o sente. Na verdade, o medo que alguém sente de perder o outro ou sua exclusividade sobre ele é um sentimento egocentrado, que pode muito bem ser associado à terrível sensação de ser excluído de uma relação (Santos, 2002, p.76)

Não há como negar que relacionamentos saudáveis consistem em respeitar e valorizar a individualidade, tanto do outro como a própria. Então, para deixar de fazer do parceiro um instrumento para curar suas dores infantis é essencial que a pessoa portadora de ciúme patológico tenha noção de que alguns problemas requerem mais que somente sua boa vontade de mudar, mas sim a ajuda de profissionais que estão aptos a tratá-lo. Felizmente há tratamento. O primeiro passo é reconhecer quando o ciúme está passando dos limites e buscar ajuda psicológica, pois como vimos anteriormente, o ciúme tem mais a ver com a relação consigo mesmo do que com quem se ama.  






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REFERÊNCIAS:

ALVES, Roque de Brito. Ciúme e Crime: Crime e Loucura. Rio de Janeiro: Forense, 2001.
STAMATEAS, Bernardo. Emoções Tóxicas. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2010.
SANTOS, Eduardo Ferreira. Ciúme e Crime: Uma observação Preventiva. Psic, cerqueira césar,
v. 3, n.2, p.74 - 77, 2002.